Empresas devedoras de Empréstimos Bancários podem ser beneficiárias do Código de Defesa do Consumidor
É natural que ao pensar em relação de consumo se imagina a empresa somente como fornecedora, e do outro lado, o consumidor.
No entanto, para o Código de Defesa do Consumidor não há distinção entre pessoa física ou jurídica, desde que esta seja a destinatária final do produto. Vejamos o que dispõe o art. 2º do CDC:
Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
Assim, em regra, para que se tenha uma relação de consumo, é necessária a presença do fornecedor, bem como do consumidor que seja o destinatário final do produto.
No entanto, considerando que a finalidade das empresas seja a exploração da atividade comercial, são raros os casos que estas sejam as destinatárias finais dos produtos adquiridos.
Então as empresas não poderão ser consumidoras nestes casos?
Como já dito, a destinação final do produto é a regra adotada pela teoria finalista.
Ocorre que a Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e os Tribunais de Justiça Estaduais, inclusive o do Estado de Sergipe, vem adotando consideravelmente a teoria finalista mitigada, também chamada de teoria maximalista.
Mas do que se trata a Teoria Finalista Mitigada?
Nada mais é que uma ampliação da aplicação do Código de Defesa do Consumidor a empresas que não são destinatárias finais dos produtos. Assim, a empresa poderá se valer de vários benefícios previstos na legislação, a exemplo da inversão do ônus da prova.
Segundo essa teoria, verificada a vulnerabilidade negocial da empresa que adquire o produto, mesmo não sendo destinatária final, pode ser considerada a relação de consumo, sendo a empresa protegida pelo Código de Defesa do Consumidor.
Por exemplo, a empresa de pequeno porte firma com a instituição financeira Cédula de Crédito Comercial para incrementar sua atividade empresarial, logo, em regra, não seria a destinatária final do produto. Porém, em um futuro litígio, sendo verificado que a empresa contraente do empréstimo bancário tinha vulnerabilidade técnica, financeira ou jurídica, há a possibilidade de aplicação do Código de Defesa do Consumidor.
Nesse sentido, em Apelação Cível nº 201800719473 julgada em julho de 2019, o Tribunal de Justiça de Sergipe aplicou a finalista mitigada para considerar a empresa como consumidora em Ação Revisional de Contrato Bancário.
No caso do precedente citado acima, tratava-se de empresa que tinha celebrado com a instituição financeira contrato de empréstimo para capital de giro, ou seja, não era destinatária final, pois visava incrementar a atividade negocial. Entretanto, o Tribunal aplicou a teoria finalista mitigada em virtude das seguintes considerações:
“Destaco que a natureza da alegada relação havida entre a Micro Empresa (autora) e a Instituição Financeira (ré) se sujeita às regras contidas no Código de Defesa do Consumidor.
Segundo a jurisprudência do STJ (Inf. 243), aplica-se ao caso em concreto a Teoria Finalista Aprofundada/Mitigada, uma vez que não obstante seja a acionante pessoa jurídica, deve ser reconhecida sua condição de consumidora, ante a sua patente vulnerabilidade técnica (ausência de conhecimentos bancários específicos) e econômica ou fática (aferida pelo grande poderio econômico das instituições financeiras frente a empresas de pequeno porte, a exemplo das microempresas).”
O Superior Tribunal de Justiça também adota a teoria finalista para os diversos casos, desde que cumpridos os requisitos que demonstrem vulnerabilidade da empresa. Neste sentido, negou provimento a Recurso Especial nº 1.730.849/SP para permitir que fosse aplicado o CDC a empresa que não era destinatária final. Vejamos:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. ENERGIA ELÉTRICA. CONSUMIDOR. TEORIA FINALISTA MITIGADA. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE, SÚMULA 7/STJ.
1. O STJ entende que se aplica a teoria finalista de forma mitigada, permitindo-se a incidência do CDC nos casos em que a parte, embora não seja destinatária final do produto ou serviço, esteja em situação de vulnerabilidade técnica, jurídica ou econômica em relação ao fornecedor, conforme entendeu a Corte de origem, no caso dos autos.
[...]
5. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido.
(REsp 1730849/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/08/2018, DJe 07/02/2019).
Desta forma, conclui-se que a teoria finalista mitigada é uma importante aliada para equiparar relações negociais entre empresas que nem sempre possuem a mesma capacidade técnica, econômica ou jurídica.